É sobejamente conhecida a existência de uma África do desenrascanço.
Dela fazem parte os chapas (=transportes públicos, com preço tabelado) que todos suportam mal mas a que a maioria se sujeita no dia a dia por falta de alternativa.
O chapa é um minibus, que em teoria levaria 9 pessoas mas que chega a meter 20 lá dentro, quantos um dia - estupefacta - contei a saírem numa paragem da 24 de Julho. Os bancos de origem são retirados e tudo se rearruma para poder ser lucrativo. Questiono-me se será, mas o lucro africano é muitas vezes um conceito diferente do lucro capitalista. Depende do ponto de partida de cada um e aqui é poderoso aliado do desenrascanço: desde que no fim do dia não tenha havido prejuízo é porque houve lucro. As horas em pé, o pó, a poluição, o mal estar, o corpo que dói, o cansaço...quem tem como actividade a economia informal não contabiliza nem valoriza nada disso. Esta é, também, a razão da falta de produtividade/competitividade da mão-de-obra moçambicana: é barata mas procuz muito pouco. É claro que este pouco depende dos olhos do analista.
O negócio do chapa faz-se assim: o dono do chapa entrega diariamente a viatura, sem combustível, a um operador que terá que lhe pagar qualquer coisa como 1000 meticais. Os custos e lucros diários vão por conta do operador. Um bilhete de chapa custa 7,5 meticais. Então vale tudo, até encurtar viagens e não passar por determinadas paragens, consideradas pouco lucrativas. Toda a ideia de serviço arredia à operação, cada um por si, para chegar ao fim do dia com lucro.
Numa semana que passei em Moscovo, a viver como os moscovitas e a apanhar os chapas locais - circulam non-stop nos bairros residenciais, param com uma aceno de mão e levam os passageiros para a estação de metro - considerei o conceito muito funcional, seguro e confortável.
Adoptado em Maputo depois da independência, altura em que a inspiração era soviética, foi-se desenrascando até se chegar à situação caótica em que uma pessoa gorda para entrar tem que pagar 2 lugares e só se pode transportar dentro do chapa aquilo que cabe no colo de cada um.
Os chapas vão acabar dentro da cidade, segundo informação oficial do Conselho Executivo (=Câmara Municipal) e serão substituídos por machibombos (=autocarros) a sério. Os chapas continuarão só fora do centro, nos bairros periféricos, no salve-se quem puder.
Enfim, veremos.
Tudo anda devagar.