No hemisfério Norte a vida cultural decorre com uma normalidade que valorizo mais desde que fui para o Maputo. Basta abrir o jornal para vermos as inúmeras possibilidades, e se for cinema aí perco mesmo a cabeça, com a quantidade e variedade. E há eventos gratuitos e bons, sobretudo de música erudita... e as noites brancas com os museus cheios noite fora madrugada dentro. Agora que aqui estou tenho aproveitado bastante e fico muito agradada com a qualidade do que aqui se faz.
Em Moçambique há pouco, por vezes bom mas nem sempre, e muita e divergente opinião sobre a qualidade da oferta, já que se se considerar tudo mau o corolário lógico será que muita gente não tem vida cultural digna desse nome. E isso ninguém quer...aceitar.
Cinemas só existe um digno desse nome, e como precisa de facturar para estar aberto, os filmes que por lá passam não têm como primeiro critério a qualidade. Andamos na fase dos vampiros...
Há ciclos de cinema, que incluem documentários, que decorrem duas vezes no ano, mas não chegam a constituir oferta cultural, antes se destinam a um nicho de espectadores.
Filmes de grande audiência, ganhadores dos Óscares por exemplo, compram-se na rua, a um qualquer dealer, às claras junto das portas dos shoppings, sabendo todos nós, eles e a polícia que é ilegal, mas ninguém se preocupa. Por vezes temos boas cópias mas geralmente são boas para o lixo. Os dealers trocam tantas vezes quantas quisermos, mas quando a coisa nasce torta...acabamos por desistir e deitamos fora.
Standup comedy está agora na moda no Maputo, os custos de produção controlados, se for um pouco brejeiro então é caixa gorda no fim do espectáculo. É cultura, sem dúvida que sim, mas do entertainment, que também faz falta para descontrair, relaxar...sei lá. Fadistas também estão na moda, mais agora que o fado é património imaterial.
Museus? há dois, o de história natural e o de geologia. O primeiro com um espólio interessante o segundo nem tanto mas a exposição desmotiva-nos assim que entramos.
Galerias de arte? ainda não encontrei nada digno desse nome...se bem que no Museu de História Natural haja bons quadros de Malangatana.
Há o Centro Franco Moçambicano e o Brasileiro que têm oferta cultural, específica de disseminação da sua própria cultura porque é essa a razão da sua existência. Mas a cidade é muito grande e francófonos são poucos, ainda assim já esperei - e desesperei - no Centro Franco Moçambicano à espera de uma coca cola fresquinha, que nem sei se chegou a aparecer porque desisti e fui para casa, e na esplanada só duas mesas tinham gente, mas era uma esplanada sem vista e a cidade tem grande oferta de locais mais aprazíveis, sobretudo nos dias de calor.
Há depois o Teatro Avenida, dirigido pelo escritor sueco Henning Mankell, que faz o que pode, e é muito, mas trabalha sobretudo para a comunidade internacional, os expatriados, e nem todos saem de casa à noite para ver a produção do Avenida, que tem custos que julgo pesados. No Avenida há um bar simpático, que por vezes tem oferta de jazz.
Há o África, a maior sala de espectáculos na 24 de Julho. Que tem um programa de sucesso voltado para a música e para os jovens. E este grupo tem de facto os seus momentos culturais, sobretudo ligados à música, com estádios cheios, muita dança, barulho e imensa alegria, num oferta que é muito parecida nos dois hemisférios.
Podemos ir à África do Sul, conheço quem faça 200+200 km para ir no fim de semana ao cinema a Nelspruit, onde também se vai à farmácia, ao supermercado, ao centro comercial, cortar o cabelo... já expliquei noutro post com Nelspruit faz parte da vida do Maputo.
Mas lá está, se queremos uma vida cultural plena, com galerias, teatros, musicais, cinemas vários etc. teremos que ir a Joanesburgo, e quando se trabalha toda a semana...faz falta o descanso e estas escapadelas são cansativas.
E na cidade há esplanadas com árvores frondosas, vistas magníficas, amigos para conversar e bons livros para ler na sombra e nós esquecemo-nos que gostamos de consumir cultura.
Há que andar devagar, se não a semana torna-se insuportável.