se vai ao longe? ou nunca se chega? Em terras do Índico, vamos abrandar...
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Dez 11
publicado por devagar, às 23:23link do post | comentar

Quando temos problemas de saúde no Maputo vamos a um médico local recomendado por alguém em quem confiamos, ou vamos a Nelspruit, apesar da estrada e da distância, pois se vamos lá só por ir ... ainda mais rápido vamos se se tratar da nossa saúde.

Os habitantes de Maputo vão ao Hospital Central.

Quando há um acidente de trabalho e um empregado tem que ir ao hospital é importante deixá-lo lá com companhia e dinheiro na mão, para garantir que o atendimento de urgência seja mesmo feito e com celeridade. Faltando o dinheiro e quem vá à procura do responsável do hospital para a negociação, o serviço far-se-á quando mais ninguém com meticais na mão e poder negocial se chegar à frente.

O critério é a carteira e não a situação em que alguém entra para ser tratado.

Sabemos disso e sabemos que temos que deixar as notas, sem as quais, e há bem pouco tempo, quem precisou de fechar um corte profundo no pé, que sangrava ferido pela aresta viva de um vidro pesado que lhe caíra em cima - e acabou por levar 7 pontos - ficaria à espera, sabe-se lá até quando, e a esvair-se em sangue.

Nas sociedades em desenvolvimento, com salários muito exíguos, os que podem, e sobretudo os que detêm qualquer tipo de poder, engordam o fim do mês, criando uma economia paralela que impede sublevações sociais. Todos os que podem, praticam-na abertamente, e condenam o país ao ciclo infernal da pobreza, pois com corrupção não há desenvolvimento.

Tudo extremamente devagar.

 


13
Dez 11
publicado por devagar, às 21:26link do post | comentar

No hemisfério Norte a vida cultural decorre com uma normalidade que valorizo mais desde que fui para o Maputo. Basta abrir o jornal para vermos as inúmeras possibilidades, e se for cinema aí perco mesmo a cabeça, com a quantidade e variedade. E há eventos gratuitos e bons, sobretudo de música erudita... e as noites brancas com os museus cheios noite fora madrugada dentro. Agora que aqui estou tenho aproveitado bastante e fico muito agradada com a qualidade do que aqui se faz.

Em Moçambique há pouco, por vezes bom mas nem sempre, e muita e divergente opinião sobre a qualidade da oferta, já que se se considerar tudo mau o corolário lógico será que muita gente não tem vida cultural digna desse nome. E isso ninguém quer...aceitar.

Cinemas só existe um digno desse nome, e como precisa de facturar para estar aberto, os filmes que por lá passam não têm como primeiro critério a qualidade. Andamos na fase dos vampiros...

Há ciclos de cinema, que incluem documentários, que decorrem duas vezes no ano, mas não chegam a constituir oferta cultural, antes se destinam a um nicho de espectadores.

Filmes de grande audiência, ganhadores dos Óscares por exemplo, compram-se na rua, a um qualquer dealer, às claras junto das portas dos shoppings, sabendo todos nós, eles e a polícia que é ilegal, mas ninguém se preocupa. Por vezes temos boas cópias mas geralmente são boas para o lixo. Os dealers trocam tantas vezes quantas quisermos, mas quando a coisa nasce torta...acabamos por desistir e deitamos fora.

Standup comedy está agora na moda no Maputo, os custos de produção controlados, se for um pouco brejeiro então é caixa gorda no fim do espectáculo. É cultura, sem dúvida que sim, mas do entertainment, que também faz falta para descontrair, relaxar...sei lá. Fadistas também estão na moda, mais agora que o fado é património imaterial.

Museus? há dois, o de história natural e o de geologia. O primeiro com um espólio interessante o segundo nem tanto mas a exposição desmotiva-nos assim que entramos.

Galerias de arte? ainda não encontrei nada digno desse nome...se bem que no Museu de História Natural haja bons quadros de Malangatana.

Há o Centro Franco Moçambicano e o Brasileiro que têm oferta cultural, específica de disseminação da sua própria cultura porque é essa a razão da sua existência. Mas a cidade é muito grande e francófonos são poucos, ainda assim já esperei - e desesperei - no Centro Franco Moçambicano à espera de uma coca cola fresquinha, que nem sei se chegou a aparecer porque desisti e fui para casa, e na esplanada só duas mesas tinham gente, mas era uma esplanada sem vista e a cidade tem grande oferta de locais mais aprazíveis, sobretudo nos dias de calor.

Há depois o Teatro Avenida, dirigido pelo escritor sueco Henning Mankell, que faz o que pode, e é muito, mas trabalha sobretudo para a comunidade internacional, os expatriados, e nem todos saem de casa à noite para ver a produção do Avenida, que tem custos que julgo pesados. No Avenida há um bar simpático, que por vezes tem oferta de jazz.

Há o África, a maior sala de espectáculos na 24 de Julho. Que tem um programa de sucesso voltado para a música e para os jovens. E este grupo tem de facto os seus momentos culturais, sobretudo ligados à música, com estádios cheios, muita dança, barulho e imensa alegria, num oferta que é muito parecida nos dois hemisférios.

Podemos ir à África do Sul, conheço quem faça 200+200 km para ir no fim de semana ao cinema a Nelspruit, onde também se vai à farmácia, ao supermercado, ao centro comercial, cortar o cabelo... já expliquei noutro post com Nelspruit faz parte da vida do Maputo.

Mas lá está, se queremos uma vida cultural plena, com galerias, teatros, musicais, cinemas vários etc. teremos que ir a Joanesburgo, e quando se trabalha toda a semana...faz falta o descanso e estas escapadelas são cansativas.

E na cidade há esplanadas com árvores frondosas, vistas magníficas, amigos para conversar e bons livros para ler na sombra e nós esquecemo-nos que gostamos de consumir cultura.

Há que andar devagar, se não a semana torna-se insuportável.

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03
Dez 11
publicado por devagar, às 18:15link do post | comentar

Por várias razões, nem sempre é fácil escrever sobre Moçambique: quem vive lá desde sempre considera que sabe mais do que eu; quem de lá saiu nos anos 70 fixou memórias utópicas e depuradas, e não reconhece o que escrevo; e, porque de África tenho uma experiência recente (significando que não percebo nada disto).

Daqui resulta ter reacções diferentes se escrevo histórias contadas por veteranos, ou se apresento interpretações minhas  contrárias ao mainstream consensual.

Do que eu tenho vivido, do que eu vejo e sinto, sou testemunha única. Tento compreender, sem generalizar, sem projectar estereótipos, sem julgar fora dos contextos culturais. Este esforço só eu valorizo. 

Enfim...

Sou a favor da diversidade, penso que a homogeneidade é inventada, parente do wishful thinking, o que é humano é essencialmente heterogéneo. O que nos dizem ser normal, muitas vezes é-o só para alguns, que de forma consciente ou não excluem os outros, que são menorizados.

Os profissionais da moda estão de olho nas ruas, não para procurar modelos, mas para se inspirarem

 

Pensar nestes assuntos leva-me a compreender a minha imediata empatia com Moçambique, desde a primeira visita, em 2005. Lá gosta-se e vive-se a heterogeneidade, nas várias línguas que os nativos falam, nas várias religiões que co-existem pacificamente, na personalização de uma simples capulana que se passeia pelas ruas, despretensiosa e elegante e em tantas outras infimas coisas. E a heterogeneidade que eu vejo pelas ruas é muito alegre o que, nos tempos que correm, não é de somenos e valia a pena importarmos para aqui às toneladas.

Estas aprendizagens vão-se fazendo devagar.

Os Tofo Tofo, dançarinos moçambicanos que inspiraram Beyoncé.

 

 

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