se vai ao longe? ou nunca se chega? Em terras do Índico, vamos abrandar...
29
Jul 12
publicado por devagar, às 09:31link do post | comentar | ver comentários (3)

De nossa casa à fronteira levamos 1 hora e uma vez passadas as formalidades do lado moçambicano e do lado sul africano (pode levar de 20 minutos a hora e meia, havendo facilitadores que nos tratam de tudo por alguns meticais negociados, mas temos que os conhecer senão pode correr menos bem...) andamos cerca de 8 quilómetros e estamos num paraíso terrestre que se chama Kruger Park.

Entrar no Kruger requer preenchimento de papeis, por vezes abrir o porta bagagens de acordo com um qualquer critério aleatório, pagamento de bilhete se somos só visitantes (europeus pagam cerca de 20€), porque se ficarmos a dormir num dos acampamentos do parque não pagamos entrance fee, e podemos usar as casas de banho, imaculadamente limpas e a cheirar bem, tomar uma bebida fresca, comprar mapas e brochuras de informações, saber se alguém avistou animais e onde, etc.

E aí com calma (anda-se devagar, o limite de velocidade são 50 km hora) podemos ver no seu habitat os animais do nosso imaginário africano, alimentado por tantas histórias de aventuras.

Para o fazermos há todo um processo, que se aprende por intuição e bom senso e na falta deste (Descartes dizia que todos tinham o suficiente, mas eu sinceramente duvido) observação do comportamento dos habitués, que são muitos. Não é nada difícil, mas binóculos são essenciais e calma, muita calma.

Ontem fomos passar o dia no Kruger, a época seca é a melhor para avistar animais, e depois de 100 desesperantes minutos na fronteira tivemos um dia absolutamente fantástico.

No Kruger depressa nos habituamos a ver gazelas, kudus, zebras, hipopótamos, crocodilos, javalis, galinhas do mato, macacos e uma variedade infinita de pássaros. Deixamos de nos deter longamente a observá-los. O que verdadeiramente procuramos são os Big Five (leão, leopardo, rinoceronte, búfalo e elefante) nome que se tornou uma marca sul africana, um cliché do marketing mas que nos enchem as medidas quando os conseguimos ver no Kruger. São fáceis de ver os elefantes e os búfalos, depois o rinoceronte sendo mais dificeis os leões e os leopardos dificílimos.

Os carros param, ninguém passa, respeita-se com prazer o engarrafamento que se forma logo, os fotógrafos disparam non-stop impressionantes câmaras com teleobjectivas poderosas, e se tivermos que esperar 10 ou 15 minutos para chegarmos ao ponto de observação fazemo-lo de bom grado porque sabemos que vai valer a pena.

Ontem tivemos a sorte de ver um enorme leopardo, primeiro refastelado no tronco da árvore a dormir e depois a comer uma presa. Já tínhamos avistado 2 leopardos noutra visita, a correr em alta velocidade mesmo à frente do nosso carro, atravessando a estrada, mas ontem viu-se com tempo.

Vimos também 6 leões e leoas, ao fim da tarde, deitados na areia na margem do rio, provavelmente à espera dos animais que vêm beber água.

Detivemo-nos a vê-los, porque 6 leões também é um caso muito raro.

 

Nota negativa: duas jovens tugas num Ford branco de matrícula moçambicana, sem paciência para esperar, sem respeito por ninguém, sem compreenderem o momentum, muito incomodadas com a imobilidade dos carros, tudo fizeram para furar o engarrafamento, marchas à frente e atrás, uma tristeza...

Mas lá está, quando não se compreende o contexto a coisa não funciona e no Kruger anda-se devagar e é muito bom.


24
Jul 12
publicado por devagar, às 14:52link do post | comentar | ver comentários (2)

Aqui já chegou o Inverno.

Os dias são curtos, as temperaturas mínimas baixas (o casaco de malha é bem vindo de manhã e à noite), a humidade já não nos põe a suar sem tréguas.

É um descanso. 

As horas de Sol são poucas mas muito boas. E este ano não há um frio digno desse nome, como aconteceu no ano passado em que andei de saco de água quente no colo para resistir...e é muito engraçado ver pessoas de gola alta de lã, kispos, botas e meias: tudo é relativo e, dizem-me os mais antigos, o tempo é um hábito como outro qualquer.

Pois será.

O Inverno aqui é muito específico: os Europeus vão à Europa, incluindo todos os tugas que têm essa possibilidade, havendo empresas que fecham duas semanas no Verão e outras duas no Natal. 

O país parece parado, mas as decisões vão-se tomando nos bastidores e os projectos adquirem forma definitiva para a rentrée de Setembro. Quem vive ao ritmo das agências de cooperação e das necessidades europeias - que é o meu caso - reposiciona-se para o que vai chegar às catadupas, pelo menos assim esperamos.

Até lá aproveita-se o sol de Inverno, as esplanadas generosas que há pelo Maputo - desde que não esteja vento - e vai-se conversando numa calma que é tão própria desta cidade e que por vezes nos esquecemos de desfrutar, porque temos na cabeça aquela coisa do time is money. 

No Maputo aprende-se a esperar.

Este país vive vários ritmos, que se vão harmonizando, desde o ritmo das monções, ao da diversidade religiosa (está a decorrer o Ramadão) e cultural e, por muito que por vezes nos custe, tudo anda devagar. 

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19
Jul 12
publicado por devagar, às 14:34link do post | comentar | ver comentários (4)

Mês atribulado pela Europa, muita viagem, muito movimento, muita família e amigos.

O tempo é o que é, e eu precisava de ter tido mais.

De regresso ao Maputo, o avião vinha cheio e partiu atrasado: Cavaco Silva e seu séquito a bordo, para prestigiar a presidência moçambicana da CPLP. Muitos empresários e guarda costas, um mundo maioritariamente masculino...que me faz sempre lembrar meninos a brincar com soldados de chumbo, tipo clube do bolinha.

De regresso ao Maputo, dizia eu, começo logo mal.

Aterro, ligo o cell (=telemóvel em língua maputense) vejo os SMS e percebo que há uma reunião para marcar que depende só do meu regresso. Uso o cell na hora para confirmar que vim sim, que já cá estou: erro fatal, esqueci-me que aqui pelas 22h30 a maior parte das pessoas já dorme...

Depois, no dia seguinte, entra pela minha privacidade a alegre Felismina, a quem ofereço o que lhe trouxe de Lisboa, incluindo uma pomada fantástica para ela por nas pernas queimadas - e visivelmente melhores - e não tenho tempo para mais, há malas para desfazer e tralha para arrumar, agendas para por em dia, telefonemas...

Venho acelerada.

O almoço correu mal, o frango meio cru, a implorar no mínimo mais 40 minutos de forno e, de uma forma geral, tudo se apresentou de forma descuidada. Zango-me um pouco (não consigo zangar-me muito porque a Felismina olha para o chão e não responde...) e na despedida digo-lhe que espero que ela venha com a cabeça no lugar no dia seguinte.

Erro fatal número 2: a Felismina estava tão preocupada com a filha - a que foi atropelada em criança por alguém que fugiu e a deixou fisicamente deficiente e se calhar também lhe afectou o entendimento, sabe-se lá, era ainda tão pequena e esperou tantas horas para ser levada ao hospital... -  que engravidara, ignorando-se com quem e onde, talvez a abrir a porta de casa a quem não deve... e há dias tinha ido tirar e que na véspera (o próprio dia do frango cru) fora com o irmão ao hospital a ver se tinha ficado bem, porque a Felismina desconfiava que alguma coisa estava a correr mal... 

Hoje, quando conversei com ela com a calma possível (sempre o fogo a atasanar o meu juízo) ela contou-me a preocupação com a filha, e as análises que lhe tinham feito no hospital, na forte possibilidade de ser diabética já que passa o dia em casa a abusar do açúcar... 

Não fiz perguntas, ouvi só, imaginando a angústia dela.

A Felismina, depois de ter desabafado tanta desgraça, ficou feliz que nem um passarinho limpou tudo com esmero e cantou muito a Jesus. E disse-me à saída, com ar sorridente, que tinha que haver salvação para a filha, e seria como Deus quisesse.

E eu disse-lhe que sim, e que seria certamente devagar. 

Estou de volta.

 


07
Jul 12
publicado por devagar, às 22:42link do post | comentar | ver comentários (2)

Voltei à Europa numa escapadela rápida que não me dá tempo para muita coisa. 

Descubro que há muita gente que me quer ver, e que eu não sou capaz de me dividir pelos eventos, jantares, cafés e tardes de conversa que me propõem. 

Estou cansada e com pena de não ter disposição e tempo para mais, e a esperar que amigos e amigas que eu não vi me perdoem e não pensem que é um descaso meu e que não me custaria nada o esforço ...

No mês que aqui tenho passado -  e que envolve 3 longas viagens com muitas horas de voo e outras tantas desesperadas em aeroportos -, dou com gosto a prioridade à família, em seguida envolvo-me nos incontornáveis assuntos burocráticos que esperam assinaturas, registos e reconhecimentos, e pelo meio numa atitude preventiva vou aos médicos, faço exames e análises e consigo as receitas para comprar os medicamentos que devem durar até ao Natal.

À minha casa não dou muita importância, já que a estadia é curta para voltar a habitá-la e a reaprender a relacionar-me com os espaços que ela me oferece, dedico-lhe os mínimos mais ao menos em todas as áreas, o que inclui um frigorifico sempre praticamente vazio: estou de passagem.

Muito depressa dou por mim a organizar malas, listas de coisas a não esquecer e a pensar em como irei ocupar as 11 horas dentro do avião que me leva de volta ao Maputo em horário diurno. Sei que vou ter que encarar as despedidas, assunto sensível que exige tanto das minhas emoções.

E nada disto é fácil.

Vou pensando que para a próxima me organizarei melhor e terei mais tempo para as pessoas, embora saiba que provavelmente isso não vá mesmo acontecer.

É esta a maldição da vida do emigrante.

E espero mesmo não ter ofendido ninguém.

Tenho saudades de ter mais tempo ou de vivê-lo mais devagar.

 


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