se vai ao longe? ou nunca se chega? Em terras do Índico, vamos abrandar...
26
Jun 13
publicado por devagar, às 14:28link do post | comentar | ver comentários (2)

Por aqui o dia-a-dia das pessoas continua muito devagar.

Começou e acabou a greve dos médicos e enfermeiros. Cerca de um mês e com resultados quase nulos.

A população sofreu maningue, mas a população aqui está habituada a sofrer e a partir de uma certa idade considera o sofrimento um estado normal.

Os mais novos não aceitam da mesma maneira e há uns espíritos mais livres que se revoltam.

Mas de uma forma geral as pessoas conformam-se com o pouco que têm, até porque não conhecem outras possibilidades.

Repórteres de jornais estrangeiros ficam admirados com a brutal clivagem entre elite endinheirada e a população, o mesmo acontece com alguns diplomatas, mas não chegam para alterar o status quo.

E apesar do que se diz de Moçambique em Portugal, não notamos nem as melhorias nem os dinamismos que os media (irresponsavelmente) apregoam. Aqui a maior parte das coisas são mesmo difíceis.

A greve dos médicos atingiu sem piedade os mais fracos.

Cenário durante a greve dos médicos em Maputo @Ussene Mamudo/AIM

Cá em casa foi a Felismina, o marido teve um AVC que lhe apanhou com severidade o lado esquerdo. Tratamento? a Felismina esfregou com uns óleos, e perguntou-me se devia por vick na perna do marido que ele não se tinha de pé. Expliquei o que pude e não mais porque sabia que o hospital tinha fechado as portas, ajudei o que pude - sempre pouco - e ela lá vai, o marido em casa (52 anos) e a ver vamos se conseguirá recuperar o que quer que seja. A família grande e às costas dela.

O dia da tragédia do AVC foi também o dia em que a Felismina levou o dinheiro em dobro para comprar a geleira, com que sonhava há anos. Saiu daqui animada para ir ao Alto Mahé fazer a compra. Durante o percurso recebeu o telefonema da vizinha a informar que o marido tinha caído perto da paragem do chapa, e que não conseguia falar. A bem dizer, a vizinha nem sabia quando se tinha dado a queda, alguém tinha dito a alguém, que tinha dito à vizinha.

E a Felismina lá foi meter-se no chapa para acudir ao marido, ainda deitado no chão à espera que ela chegasse.

E o dinheiro da geleira acabou por ir parar às mãos de um médico (?) privado, e o marido da Felismina voltou a falar mas não registou outras melhoras.

A linha entre a pobreza e a miséria é aqui muito ténue e a Felismina bem quer, mas não lhe consegue escapar.

Só mais um pormenor: o vencimento da Felismina é superior ao de um enfermeiro em início de carreira.

E agora?

 

 


14
Out 12
publicado por devagar, às 15:15link do post | comentar | ver comentários (9)

Por aqui há dias bons e dias menos bons.

O dia-a-dia nem sempre é fácil, o mal está em esquecermo-nos disso e abrandarmos a vigilância.

Há horas em que deveríamos estar quietos. Horas em que estamos onde não deveríamos estar. Num momento estamos bem, divertidos e cheios de planos para um jantar agradável e um fim de semana longo a ver os animais no Norte do Kruger, e no momento seguinte - o da hora escolhida de quem dentro de um carro como qualquer normal consumidor espera para nos roubar - deixamos de ter certezas, lutamos para não nos levarem tudo mas - lá está - nessa altura deveríamos era ter estado noutro sítio.

No fim do dia uma certeza: neste continente há um esforço a ser feito no sentido do empowerment em direitos humanos e do consumidor. Direitos nesta zona adquirem-se com dinheiro, e é bom andar prevenido.

Ver guardas nos parques de estacionamento, ver câmaras colocadas nos cantos estratégicos desses parques, não é garantia de que estamos protegidos, antes pelo contrário.

Na 4ªfeira passada, dia 3 de Outubro, ainda era dia, fomos assaltados quando saíamos do carro,  no parque de estacionamento do Riverside Mall em Nelspruit, na entrada que dá acesso ao Mug & Bean, que é a nossa preferida e de milhares de moçambicanos que lá vão fazer compras durante os 365 dias do ano.

Pelo facto deste Centro Comercial facturar alto devido ao input dos meticais moçambicanos, deveríamos ter sido bem tratados pelos guardas e pela polícia. Não fomos nem bem nem mal tratados: a câmara não funciona, os guardas que estavam a 5 metros nada fizeram- ficámos até a pensar que faziam parte da quadrilha - e a polícia que foi chamada ao local apenas nos quis levar para a esquadra para escrever o nosso depoimento e no dia seguinte dar-nos uma certidão, com a qual passamos a fronteira sem problemas e no Maputo começamos a saga difícil de recuperar a identidade, e todos os documentos que essa identidade implica, que nos usurparam num parque de estacionamento de um shopping que 'se vende' como local seguro.


Como temos amigos e algum dinheiro fomos conseguindo resolver a situação de ficar sem passaportes, autorizações de residência, dinheiro para a estadia no Kruger, cartões de crédito, 3 blackberrys, o meu ipad (que já fazia parte de mim), chaves e documentos do carro, os medicamentos, a máquina fotográfica, e outras coisas de mais fácil substituição.

Oferecemos resistência - um erro que pode tornar tudo mais violento e perigoso, mas naquela altura não se pensa nisso - e os guardas continuaram só a olhar.

Já no Maputo, vamos tomando conhecimento dos casos de muitos moçambicanos que passaram por semelhante experiência. Alguns perderam o gosto por ir a Nelspruit às compras. Nós ainda não sabemos bem como nos vamos comportar, mas gostamos de pensar que iremos esquecer. Por enquanto estamos só a continuar.

Devagar.


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